quinta-feira, 16 de agosto de 2007

4. Desculpas

Já falei sobre o dia em que Sofia sentiu ciúmes? Ah. Não me venha com esse papo pós-moderno de novo. Ela sentiu ciúmes, sim. Enrubesceu-se tanto que ficou quase como quando nos beijamos escondidos à meia luz da 1º de Março. Eu me lembro bem, era uma segunda-feira. Tentamos umas três exposições, mas nenhuma parecia estar ainda aberta ou em cartaz. Eu comprei umas poesias na porta de uma delas pela metade do preço e por pura piedade. Não conseguiria admitir empatia pelo rapazinho de barba, mesmo se os versos dele valessem alguma coisa. Fomos até o fim da rua estreita de pedras portuguesas e tomamos três ou quatro copos de Salinas.

Aqui estou eu emendando um assunto no outro. Falava sobre o rubor na pele branca de Sofia. Ela tinha os olhos tensos; o olhar era praticamente o mesmo – surpreendi-me. Foi a primeira vez, desde as juras de amor, que eu me senti desconfortável ao seu lado. Não sei o que temia, ou se tremia – não me lembro. Pensei em levar-lhe uma lembrança. Lembrei que Ovídio, latino de 43 a.C., registrou em um de seus romances, a título de premissa principal, que um infrator não deve se mostrar culpado além do suficiente. Sabe-se lá se ele estava ou continua certo. Todo mundo entende que, em nosso tempo, delegam razão a Freud, gregos e liberais.

Por via das dúvidas, concedi a Sofia meu mais terno abraço o tempo que bastou para que ela se convencesse da gaze e do esparadrapo. Eu cobri sua ferida infantil com beijos e merthiolate que não arde. Ela se escondeu na caverna, bichinho do mato no inverno. E ainda fez bico! Olha, mas vejam só. Então eu disse, como dizia o meu avô, que iria pôr o seu bico no feijão! De manhã, ela saiu cedo do edredom esconderijo e me trouxe café na cama. Sofia aborreceu-se com a minha lentidão ao acordar. Resolveu descontar no cinzeiro. Eu já disse que Sofia fica linda quando aborrecida?

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